Ancuabe “aprova” projecto da FuraGems sob olhar atento do Governo

 Consulta comunitária ou formalidade política? 

A consulta pública realizada esta sexta-feira, nas comunidades de Nacoja, Nacaca e Kampine, distrito de Ancuabe, para o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) do projecto de exploração de rubis pela FuraGems Moçambique, terminou com uma “aprovação unânime” do investimento. 

Só que, o encontro foi presidido pelo Administrador distrital, Belmiro Casimiro, uma presença que levanta questões sobre a real autonomia das comunidades na tomada de decisões sobre os seus próprios territórios.

A reunião, que durou cerca de dez horas, foi apresentada como um exercício de participação popular, mas fica a dúvida: o que se pode realmente esperar de uma “consulta comunitária” quando o Estado representado pelo mesmo governo que concede licenças e arrecada receitas está ao comando do processo?

O consultor ambiental foi citado destacando que a exploração “organizada” dos rubis trará desenvolvimento económico local, empregos e melhores condições de vida. Contudo, pouco se falou dos impactos cumulativos da mineração na região, já marcada por deslocamentos, conflitos de terra e promessas incumpridas de outros megaprojectos.

Apesar da classificação ambiental “A”, que implica riscos elevados e necessidade de rigor na mitigação de impactos, o EIA foi descrito como tendo “baixo impacto ambiental”. A contradição passa despercebida num encontro em que o tom de entusiasmo pareceu suplantar a crítica.

A comunidade, segundo fontes locais, apoiou o projecto “de forma unânime” um consenso improvável em qualquer debate genuíno. 

É legítimo perguntar se houve espaço real para a discordância, ou se a “participação” se limitou a aplaudir um investimento já decidido.

No final, o Administrador agradeceu “o envolvimento de todos” e apelou à rápida conclusão dos estudos técnicos, enquanto o representante da FuraGems prometeu cumprir todas as normas ambientais e sociais. Promessas semelhantes ecoam há anos em Cabo Delgado, onde o “desenvolvimento sustentável” continua a ser mais um slogan do que uma realidade tangível.

Com uma segunda consulta prevista apenas para dezembro de 2025, o projecto segue adiante, reforçando Ancuabe como novo ponto da rota mineira de Moçambique e reavivando a velha questão: quem realmente ganha quando o governo consulta o povo sobre um negócio que ele próprio já endossou? (Mozanorte)

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